quarta-feira, 11 de outubro de 2023

Covilhã, Jogos Olímpicos 2668


Covilhã, Jogos Olímpicos de Verão de 2668

Todo o país prepara-se com afã para mais uma edição dos Jogos Olímpicos da Era Tecnológica. Já longe vão os tempos em que as modalidades separavam géneros e, principalmente, no período pós pandémico (lembram-se do Covid19 no XXI?) toda a sociedade evoluiu no sentido de tornar todos os eventos desportivos assexuais, por forma a que todos os géneros e convicções individuais pudessem participar nas mesmas provas. O mundo fartou-se de polémicas. Fartou-se de imposições. Fartou-se de guerras. Fartou-se de conflitos gerados pela intolerância e decidiu reformular a prova.

Hoje, androides, humanoides e outros especímoides participam ombro a ombro com os (já poucos) homens e mulheres ainda existentes.

As provas, por consequência, foram alteradas e adaptadas. Chegou-se a um marasmo competitivo. Os antigos recordes não foram mais batidos durante décadas, estabelecendo assim, marcas que jamais se ultrapassariam. Chegaram a haver olimpíadas com menos share nas tv's do que as novelas turcas da SIC Mulher. Estações chegaram a encerrar portas por falta de audiência e era um perigo arriscar-se a transmissão do evento. 

A antiga humanidade tinha atingido todos os limites possíveis e imaginários. Num esforço concertado, conseguiu-se que o espírito de Coubertain não fosse esquecido e revolucionou-se o evento. Foram repensadas as modalidades antigas e adaptadas a novos estímulos e desafios. Foram criadas novas provas por forma a que todos, sem excepção, pudessem participar.

No entanto, os festivais desportivos deixaram de necessitar de estádios novos a cada quatro anos, podendo ser transmitidos em qualquer lugar, fosse na rua, armazéns ou até casas próprias. A sociedade não se compadeceu com esbanjamentos fúteis de dinheiros que acabaram sempre por prejudicar o povo. E mesmo que se saiba que os Chineses continuam a dominar o que quer que seja, (também são exponencialmente mais do que os outros), o ligeiramente maior mas ainda assim - pequeno Portugal continuou a dar provas de resistência e é, neste evento, um dos países mais respeitados e consagrados mundialmente.

A anexação da Galiza e retomada de Olivença aumentou-nos o território, a população e o número de  participantes. A prova deixou de ser exclusiva dos atletas. Qualquer cidadão, maior de idade, ao entregar as declarações de IRS recebe uma senha com um código que estará sujeito a sorteio. Nunca se viu tamanha ligação de afecto entre contribuintes e repartições de finanças.

Desapareceram provas que, já de si, criavam um fosso enorme entre os géneros predominantes.

- A Halterofilia, foi banida. Chegou-se à conclusão que a prova apontaria em sentido único e nem mesmo com a participação de transgéneros nas provas femininas a coisa corria bem. Chegou a haver motins por causa disso e o impacto social teve consequências graves.

- O lançamento do disco, foi substituído pelo arremesso do boomerangue, onde todos os participantes concorrem ao mesmo tempo, lado a lado. Ganha quem conseguir (apanhar com) mais boomerangues.

- As corridas de obstáculos, saíram do tartan para grandes pavilhões com muito móveis carregados de pechisbeque, bugigangas e tralha cerâmica, onde o objectivo é cumprir um percurso traçado no chão, no menor tempo e se possível sem derrubar a dita tralha decorativa que os nossos antepassados usavam em casa e que os seus sucessores iam herdando, nunca sabendo o que fazer áquilo. Ainda hoje se nota algo de catártico no decorrer da prova, sempre que alguma peça é derrubada. Ainda para mais porque a prova é efectuada com humanos e humanoides com mais de 250Kgs. Pode durar mais de 4 horas. E os corredores só têm 60cm de largura. Quem boicota esta prova constantemente são os chineses porque consideram que esta prática destrutiva é uma afronta ao passado cultural e ao nascer de uma antiga economia de mercado que os sustentou durante largas décadas durante os séculos XX e XXI. Portugal sugeriu que o pó recolhido dos cacos partidos fosse reutilizado na construção de vias e autoestradas e revelou-se uma grande mais valia a nível mundial. Hoje temos mais autoestradas que qualquer outro país do mundo. A A963  entre a Arrifana e S. João da Madeira e e o IP 1315 entre a cantina de Sto. António e o Tortosendo são os troços mais movimentados.

- A prova do lançamento do dardo foi substituída pelo lançamento de um objecto de uso diário e extremamente útil que é o palito dos dentes.

- O lançamento do peso é feito nas repartições públicas numa alusão clara ao peso da burocracia. O objectivo é transportar uma pilha de processos desde a entrada do edifício até uma divisão escolhida pelo júri a fim de obter-se um carimbo de aprovação. Os concorrentes não sabem que divisão é essa. Às vezes nem os próprios juízes têm a certeza absoluta de onde fica a tal divisão. Os concorrentes além de irem sem saber por onde começar, vão com os olhos vendados e terão de responder a inquéritos sem fim ou serem transferidos para outras divisões antes de obterem o tão desejado carimbo. Cada prova, normalmente tem uma duração aproximada de mês a mês e meio porque a maior parte do tempo, é passada a dormir. Logo que um participante descobre qual a divisão certa, arremessa o processo para o centro da mesma.

- Os 100m foram substituídos por uma prova de 60m de passeio à trela de animais que não se possam ver. Cães e gatos, mais lebres, ratazanas e outros, concorrem no mesmo pé de igualdade, a bem da inclusão. Para estimular a competitividade, os concorrentes têm uma perna atada a uma das patas dos animais. Os animais devem jejuar durante 3 dias a fim de obterem os mínimos olímpicos requeridos. O concorrentes também. Se possível no mesmo espaço. Exíguo e às escuras como mandam os trâmites.

- As provas de natação foram abolidas. Muitos robôs queixavam-se que não conseguiam manter-se à tona da água. Concordaram em participar nas provas de saltos para a água com a condição de alguém os ir buscar ao fundo da piscina. Acabou por se tornar algo infrutífero, porque em muitos casos, a organização via-se na necessidade de esvaziar a piscina para os ir recolher.

À excepção da prova dos 60m de trela, todas as outras provas que envolvessem animais foram extinguidas.

- O hipismo acabou e optou-se pelo "aboborismo". No princípio só os gajos do PAN acharam que aquilo era decadente para os cavalos e depois vieram os vegetarianos a afins, dizer que brincar com a comida era indecente. No meio da história, salvaram-se os jóqueis que do alto dos seus 1,30m continuaram a conseguir ser incluídos em provas decentes. As provas agora são feitas com aquelas bolas gigantes que há nos ginásios. Sim, daquelas com dois corninhos. Para evitar mais confusões. É atada uma mecha acesa à bola é o objectivo é cumprir um percurso com obstáculos de hipismo. A prova termina quando acontece uma de duas coisa: ou a bola explode, ou se pega fogo ao jóquei. Em ambos os casos, mede-se sempre a distância percorrida e ganha quem tiver mais. Tivemos um aluno da UBI tetraneto do Marques Mendes, campeão olímpico nesta modalidade durante 20 anos.

- Na esgrima, sabres e floretes foram substituídos por mata-moscas. Transformou-se algo monótono cujas regras nunca ninguém percebeu por algo mais divertido. A meta é atingir 30 chapadas. Ou provocar a desistência do adversário. (O Record mundial é português. O recordista é aparentado de uma figura mítica da história que era a Padeira de Aljubarrota e conseguiu 31 pancadas porque a última ressaltou). Substitui-se o "touché" por um "chupé".

- As provas físicas de contacto são o prato forte. Todas as quezílias a nível mundial são resolvidas no ringue. Aos vencedores, a glória. Aos vencidos, o rosto desfeito e um pedido público de desculpas. Só se poderão voltar a defrontar duas nações, passados 20 anos. Tem resultado. O mundo tem vivido anos de paz. De vinte em vinte anos. O que já não é mau.

- As provas de ciclismo são efectuadas em vias urbanas durante as horas de ponta. É possível pedalar tanto em estrada como nos passeios e passadeiras. A regra do metro e meio não existe. O percurso tem 200m de comprimento e é raro ser terminado. Também é possível os concorrentes verem a reacção do público. Por forma  a que haja mais interacção e espectacularidade, o público é incentivado a "enviar com decência" os ciclistas para as pistas que menos estorvem o passeio pedonal. As bicicletas já não são de fibra de vidro nem materiais leves. Parecem-se tractores mas com duas rodas. Os ciclistas vestem a mesma coisa de há quinhentos ou mais anos.

- Continua a ser na Maratona que focam todas as atenções e é a última prova do calendário. A populaça acorre às ruas para incentivar e torcer pelos corredores, de uma forma só vista quando o Sporting ganhava campeonatos. Há uma curiosidade quase mórbida em se saber quem é que, no meio daquela multiplicidade de género, identidade ou forma, levará para casa uma estatueta dessa lenda do desporto mundial que foi a Jarmila Kratochvilova. Uma beldade checa com grandes tomates que brilhou nas longínquas olimpíadas do final do século XX. É correr até cair para o lado. O recordista em título é um etíope que começou a correr há 30 anos atrás e nunca mais ninguém o viu...

sábado, 9 de setembro de 2023

DOIS ESTUDANTES FIZERAM A PONTE LINGUÍSTICA NA UBI

O Teodósio era um puto recém chegado à UBI, tímido como o raio, muito ensimesmado e que não era visto propriamente como aquele colega que, mesmo que passasse pelos pingos da chuva, poderia haver aqui ou ali algum nerd que lhe fosse mais chegado. Não era mal formado ou mal educado mas também não era necessariamente um íman social. A rotina diária, sempre solitária, tinha apenas três pontos no seu GPS interno: casa, Universidade e cantina.

Certo dia, um daqueles cuja meteorologia metia medo ao susto, conheceu Minerva, uma moça que vinha em Erasmus proveniente do Instituto Politécnico de Vaduz, onde, apenas por um alinhamento astral improvável, era a versão dele em feminino. Quis o acaso que tivessem de comer juntos nas cantinas de Sto. António uma vez que todos os lugares estavam ocupados. Por pessoas, por mochilas ou amigos invisíveis. E eles eram tímidos demais para pedirem para se sentar junto de outros colegas. 

Ficaram portanto ali especados um em frente ao outro e, aos poucos, foram desenvolvendo um dialecto próprio - ela não pescava uma de português e ele via-se da cor da abelha para perceber liechtensteiniano - bastante satisfatório a nível auditivo porém muito vago ao nível cognitivo. E essa interacção apenas se produzia através de onomatopeias consoante o que iam achando da comida. Em certa medida, dois alunos com evidentes problemas relacionais e comportamentais por resolver, interagiam como dois Neandertais em volta de um javali no espeto. Isto provocou uma onda de indignação e espanto perante os demais colegas que ao longo dos tempos iam-se apercebendo que afinal de contas aqueles dois tinham quebrado uma barreira linguística de uma forma que poderia servir de base para uma tese de doutoramento qualquer. Não era de estranhar  portanto, que a malta de Sociologia fosse aquela que se sentava ao redor, a fim de ir captando aqui e ali algum motivo para aprofundar. 

Não pensem no entanto que era sempre uma conversa cordial. Minerva era vegan e Teodósio era carnívoro. O que provocava grandes altercações entre os dois por falta de acordo e por, cada um e à vez, irem derrimindo os argumentos do outro. A conversa ficava feia quando ela argumentava em modo grunhido insatisfação por ele estar a mastigar um peru ou quando ele queria à força toda que ela experimentasse salpicão. Mas em contraponto era um deleite para os sentidos vê-los quase orgásticos a degustar um bróculo envolvido numa folha de alface. O êxtase era tal que numa vez foram chamados à reitoria para dar explicações. Não por o reitor ser meio tã-tã (todos sabemos que alguns reitores parecem sê-lo mas ninguém se atreve a dizê-lo) mas porque tinham decidido fazer uma table dance em bottomless depois de espalharem paté de grão de bico no alho francês de um auxiliar que ia a passar.

O pouco que se sabe deles é que ela voltou a Erasmar em Nice, Fucking e Bro (França, Áustria e Suécia) enquanto ele voltou para a Coina onde é professor de Álgebra. Encontram-se todos os anos em Kagar na Alemanha para pôr a conversa em dia.