domingo, 30 de agosto de 2020

Soneto prometido ao grande cronista João Leonardo, ilustre ubiano dos remotos eighties, caso publicasse nova crónica. Ele publicou, e o soneto aí está :)

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SONETO A JOÃO LEONARDO


Leonardo Da Vinci, sim, só há um…

Mas João, ó que grande felizardo,

Tem pelo menos com ele, em comum,

O excelso e belo nome “Leonardo”.


João Leonardo, o engenheiro,

que ocupa os silêncios com a escrita

Não perde um comentário certeiro 

Aos “posts” que este seu amigo edita…


Cronista dos “Encontros Ubianos”

doido por carros, por velocidade 

piloto de ralis sempre arrojado


Ousado cruzador de oceanos

p’ró Canadá levou toda a saudade

No coração, a pátria do fado…


Gondri

quarta-feira, 26 de agosto de 2020

A maior lacuna do ensino universitário na UBI, nos anos 80











Há um par de dias atrás falando com o Nuno Ramos a propósito de comemoração do aniversário da página dos Encontros Ubianos e de como continuar a atrair novos e da velha guarda estudantes universitários da UBI,em torno deste objectivo comum da promoção da nostalgia, memória e espírito Ubianos, resolvi escrever estas linhas por achar que vinham a talho de foice para esse marco histórico de um ano volvido sobre a data da criação das plataformas digitais para difusão desse espírito académico tão marcante nessa época. E porque de plataformas digitais se trata, trouxe-me á lembrança talvez aquela que no meu humilde diagnostico organizacional, foi identificada como a maior lacuna do ensino universitário da UBI, nesses distantes anos: - o facto reconhecido e aceite de entre tanto conhecimento e fervor pedagógico da classe docente e discente,e demais população universitária não nos ter nunca preparado para o impacto tecnológico a que hoje assistimos com a proliferação das redes sociais, das consolas, dos telemóveis inteligentes e de uma maneira geral, para a utilização da tecnologia como suporte da vida quotidiana e no que isso afecta a personalidade de cada um. Pareceu-me assim indubitavelmente, que seria um bom tema para comemorarmos condignamente esta efeméride iniciada pelo Nuno e abraçada por todos nós orgulhosos Ubianos e para cujo crescimento temos vindo a contribuir.

Bom, e uma lacuna porquê? Porquê falar de algo que falta ou que não está bem,num dia que é suposto ser de comemoração,júbilo e alegria?E será que todos acham o mesmo ou haverá quem identifique outras maiores? Na minha modesta opinião, parece-me que não haverá maior lacuna de conhecimento do qual fomos todos privados por termos estudado á época em que não faziam falta quaisquer plataformas digitais.

Afinal, quem é que deixou de acabar o curso por não existir á época, o Facebook? Ou o Twitter? Ou quem concluiu o curso com maior distinção por ter acesso a informação contida nas redes sociais ou por ter trocado informação com outros internautas por essa via? Ninguém certamente, pois á data não havia FB nem Twitter nem outra coisa qualquer. Quem deixou de ir á loja fazer compras para passar a comprar no FB Marketplace ou nos OLX,ou nos VIBBO, ou noutros sites quaisquer de compra e venda?Ninguém, ninguém e mais ninguém!! Ninguém perdia tempo com isso nessa época!!”NÃ HAVIA”(alentejano), “ Niente”, “Bola”!!! para dar todos os sinónimos de “Zero”, muito em voga hoje em dia!

Algumas explicações para esse “fenómeno” residiam no facto de não termos sido induzidos a pensar que essa época estaria mais próxima do que muitos, mais futurologistas, anteviam! Achava-se que a tecnologia viria,como se de uma profecia se tratasse, mas seria no ano 2000, com o passar do milénio!Em 2000 poderiamos teletransportar-nos para qualquer estância para disíaca de férias, ao pressionar um botão e os carros tais como os conhecemos não existiriam, pois andariam todos no ar! Depositava-se muita esperança tecnológica nesse ano, muito por culpa das séries de ficção que víamos na TV.Já há muitos anos que vínhamos a ser induzidos a pensar nesse futuro tecnológico (quem não se lembra das séries do Espaço 1999 onde já havia naves espaciais e tecnologia a rodos para todos percebermos que havia toda uma conquista tecnológica pela frente! E mais tarde do “Caminho das Estrelas”, onde além das orelhas do Spock a tecnologia era toda “friendly user” e bem “cool”!!), para muitos ainda a muitos anos-luz de distância dos anos 80, que naturalmente eram anos mais apagados qualquer que fosse o ângulo de análise.

Eram anos mais apagados mas mais felizes também!! Oh, se eram anos felizes!! Senão vejamos: 1) Éramos todos mais novos,catraios e catraias cheios de sede de conhecimento e vontade de aprender e de sermos todos doutores, doutoras, engenheiros e engenheiras.Uns mais do que outros estudávamos QB (quanto baste) como o sal na comida. 2) Por causa do ponto 1) tínhamos grandes ambições na vida universitária e nas possibilidades que essa vida apresentava, depois de passarmos pelos bancos da UBI. Promessas assentes na ilusão de alguns de nós estudantes com nobres pensamentos do tipo: “quando sair para o mercado de trabalho, aquilo é que vai ser,é só abanar o canudo e pedir 5000 de salário, um gabinete e uma secretária!! Afinal sou um engenheiro, e a malta vai-me toda prestar vassalagem”, Ou outros que pensavam “quando sair daqui finalmente posso tomar conta da empresa ou do negócio do meu pai” (certo dia confrontei alguém que se saiu com este pensamento durante uma viagem, ao meu lado, e tendo ficado um pouco chocado, acabei a dizer-lhe: “peraí, então mas tu vens para a universidade tirar um curso superior, durante cinco anos para ficares á frente do negócio da família!????” Não precisas, pois certamente o teu pai ou irmão um dia te farão herdeiro e gestor do negócio!!”, “Ou se é para fazer umas escritazinhas e ter um escritório de contabilidade (argumentação auto-motivacional que também se ouvia muito,nesses tempos!) não é preciso vires tirar um curso de Gestão de Empresas para a UBI”!! Enfim andava muita gente enganada a frequentar a UBI desses anos no que toca ás motivações e aos propósitos da frequência universitária.

Lembro-me que em simultâneo também se conseguiam identificar outros grupos de tendências motivacionais para a desejada frequência universitária e da vida académica: Havia quem evidenciasse que “ando na Universidade para os pais não chatearem, não importa o curso, é preciso é ser doutor e se não gostar no final do ano, troco e vou para o Técnico!” e também quem claramente andava na Universidade para “ a par do curso arranjar marido ou esposa, para a vida!!”. Éramos uma grande família e uma família das boas, firme e consolidada,mas onde proliferava a liberdade de escolha e onde imperava a diversidade de opiniões, experiências e motivações. Como já anteriormente dizia, eram tempos e reminiscências ainda muito frescas do pós-Abril. Divertíamo-nos todos á grande e “á portuguesa”, festas contínuas que pareciam fazer de todas as vulgares semanas, semanas académicas. Lá nos íamos conhecendo uns aos outros, partilhando cafés no bar, boleias para casa aos fins de semana (era o verdadeiro “carpooling”, já na altura!) ou jogos de cartas nas lentas viagens de comboio de e para a Covilhã, ou na “sueca” nas noites de estudo em casa de colegas, quando nos aborrecíamos com a dificuldade dos exercícios. Comíamos lanches e sandes que fazíamos para levar para os poços das Penhas onde íamos a banhos, fazíamos caminhadas na neve para subir ao Cântaro Gordo, Piqueniques e acampamentos no meio dos turistas, no Covão da Ametade,tardes de Ski, na Torre ou testávamos as habilidades ao volante nas primeiras neves e no gelo no Centro de Limpeza da Neve nos Piornos.Víamos as rampas da Covilhã todas na íntegra, dos treinos livres á última subida oficial,tirávamos alguns dias de estudo para fazer “uma vaquinha” e com as primeiras experiências de logística de viagem, íamos ver os principais ralis do campeonato e romávamos sagradamente anualmente ao Rali de Portugal.

Comíamos razoavelmente bem, ríamo-nos como uns perdidos sempre que havia partidas ou praxes na Residência ou numa qualquer rua da Covilhã. Conhecíamos a gastronomia e as discotecas do Ourondo, do Fundão, de Castelo Branco, da Covilhã, os bares da Guarda, e alguns de nós já então alargavam os horizontes ás discotecas de Salamanca.Comíamos magustos de castanhas em Setembro, na esquadra da PSP, até ás tantas da noite, em grande cavaqueira com o comissário e outros agentes que acarinhavam os estudantes universitários da sua cidade, num hino ao bem receber da cordialidade das gentes beirãs. Cozinhávamos para as amigas que convidávamos a provar os petiscos que fazíamos (e para estudar, muito estudo, muito estudo!!) Bebíamos cerveja ou finos com groselha e panachés no Primor, no Montalto ou mais tarde no Fora d´’Horas, ordeiramente ao som de boa música até ás quinhentas da manhã, quando íamos á padaria da Rua da Indústria comprar ás dúzias de natas quentinhas e carcaças estaladiças acabadinhas de fazer.Quem tinha, ou passou a ter (depois de arranjar), ia á noite esperar a namorada ou o namorado ao Expresso da Joalto ou da Rodoviária,na altura, em frente das arcadas da Câmara Municipal ainda com o largo amplo e transitável.Iamos com os amigos, amigas ou namoradas ao cinema ver filmes que já andavam há uns anos nos circuitos comerciais! Gostávamos daquilo! Eram anos de “uma grande colheita”, e apesar de tudo estávamos lá para frequentar a universidade e nos licenciarmos, o que todos conseguimos fazer.

Eram anos tão bons e com tão óptimas recordações que já me esqueci do que queria dizera seguir!! ………..Ah! Já sei!!...... E onde é que estava o Facebook? E o Twitter? E o Instagram? Whatsapp? Tik Tok? E o Google ou o Messenger? Simplesmente não havia, e por isso não estávamos preparados para o impacto que aí veio a seguir-se. Não andávamos pendurados em smartphones, mas antes andávamos atentos a tudo o que nos rodeava, a desfrutar cada experiência e minuto de vida universitária!Também não havia ainda grandes telemóveis XPTO e os que havia serviam para fazer chamadas apenas e só!. Vi os primeiros na mão de um professor,daqueles do tamanho de uma mala, que se extraía da consola central dos BMW ou de outros carros de topo de gama, e que pesava aí uns 4 ou 5 Kg! Eu tive um dos primeiros verdadeiramente portáteis que apareceu um Motorola com razoável autonomia e pesado como o chumbo, mais ou menos do tamanho de um tijolo refractário. Que aliás tanto quanto me lembro obviamente também só utilizava para telefonar, a maior parte das vezes para casa, e á medida que alguns poucos amigos iam tendo telemóvel também para eles!.Raro muito raro de utilizar, até porque ainda tinha pouca autonomia e era preciso uma gestão minuciosa da bateria!!Eh!eh!Uma máquina infernal!!

Sempre achei “porreiro” o facto de termos tecnologia nas mãos, que fomos aprendendo a utilizar aos empurrões por nos recusarmos a ler previamente os manuais de utilizador! No entanto, outro dos aspectos para o qual nunca fomos alertados pelos nossos docentes enquanto frequentávamos as suas disciplinas, foi para a revolução linguística que o impacto dessa tecnologia iria trazer nas nossas vidas e na nossa formação enquanto pessoas e universitários culturalmente bem desenvolvidos. Ao entrar na UBI, todos mesmo os que vinham do Norte, ou de Mirandela,ou da Madeira e Açores, vínhamos bem formados dos tempos de liceu, e a falar e escrever bom português gramaticalmente correcto.Sabíamos o que era um dicionário e a tabuada! Pelo meio dos anos de vida universitária começava a falar-se na introdução do novo acordo ortográfico, e perspectivava-se que todos começássemos a falar brasileiro de Portugal, por oposição ao português do Brasil. Era a nova moda, cuja tendência agradava a uns mas deixava outros indiferentes com o “fato”, mantendo o “facto”, para não se confundir com a peça de vestuário.”Octavio” agora era “Otavio” e mais tarde, muito mais tarde “matraquilhos” passou a ser “pingolin”!! Igualmente,termos como “producção”,”ficção”,”dicção” ,”actualidade”, passaram a ser “Produção”,”fição”, “dição”,”atualidade”. Não estávamos preparados para esta mudança, pois ninguém anteviu ou preparou conhecimento para noas ajudar a enfrentar isto, no meio universitário.Ainda para mais porque queriam forçar coercivamente, maioritariamente alunos de engenharias a absorver as suas matérias num novo português, da treta, que muitos tal como eu fizeram por ignorar dado o carácter facultativo do acordo. Nesses tal como em mim o impacto não foi muito! Ainda assim nunca me senti preparado para largar o dicionário e escrever preguiçosamente como se fala, depois de beber quiçá uma ou duas cachaças e um chôpe traçado. Até porque a supressão dos “C” na maior parte das palavras, que foi talvez a alteração mais visível desse acordo, não se aplicou a todas as palavras, nem simplificou outras mais elaboradas. Por exemplo não parece que a palavra “ aralho” que definitivamente perdeu o “c” , conste do vocabulário das terras de Pedro Álvares Abral, antes é mais uma expressão fanhosa da cultura das nossas gentes. Por isso e infelizmente sempre senti não ter sido preparado para entender este apenas “meio acordo” ortográfico.Já não pensaria o mesmo se palavras como “Otorrinolaringologista” tivessem sido alvo de simplificação, mas sabe-se hoje que amargamente depois do tal meio acordo ainda é tão difícil pronunciar como era dantes!

Naturalmente quando este fenómeno se deu, nem eu nem o meu telemóvel, na altura a frequentarmos ambos a UBI, estávamos preparados para isto!!!

Nem para isto nem para o que se passou a seguir, anos mais tarde, primeiro com o aparecimento das consolas e depois com a vulgarização dos smartphones, alguns dos quais bastante impactantes na personalidade do indivíduo por serem inclusivamente mais inteligentes do que os donos. Outra das grandes lacunas para as quais ninguém na UBI de então fora avisado! Ainda mais nocivo do que o acordo ortográfico, foi o fenómeno combinado da preguiça, ignorância linguística e dedilhar rápido,agravado pelo fenómeno da tecnologia com activação por voz. Então para isto é que ninguém foi preparado!! Esta sim foi a maior lacuna que atravessou transversal e longitudinalmente,os anos 80 até aos dias de hoje, onde apesar de grandes marcos tecnológicos e da conquista aerospacial, a população universitária da UBI sofreu um impacto tremendo com efeitos psicológicos e provocou barreiras ao nível da comunicação. Ninguém estaava preparado para mensagens do tipo “Tou a kurtir boé” ou “O ké k se kome na kantina hj?” ou um mais socialmente aceitável: “Tásse bem bro,no prob!!”.

Com estas expressões assistir-se-á num futuro próximo ao reescrever das sebentas académicas, das Letras á Gestão, até ás Engenharias! Numa abordagem visionária parece-me que será tão difícil entender as matérias que teremos que ter um tradutor de voz, daí a tecnologia tendencialmente se inclinar para o reconhecimento da voz. Também será impossível reconhecer os colegas, pois com toda a gente a escrever assim tão mal, o que der mais erros é o Alberto e o que ficar a seguir é o Amílcar e assim sucessivamente até chegar ao último da lista, burro,o Zacarias,que não sabe escrever com “k”s em vez de “quê”!Mesmo a voz se for programada para reconhecer construção de frases gramaticalmente correctas, quando alguém disser “ abre k já tou late” vai fazer com que a porta permaneça fechada para irritação do dono da voz! Decididamente alguém se sente preparado para isto?Parece-me bem que não!!

E voltando ao FB, ao Twitter e ás outras redes sociais, alguém que tenha estado nos saudosos anos 80 na UBI sentirá verdadeiramente a falta das plataformas digitais??Quem consegue ir tomar um café com um amigo a escrever no Facebook? Ou jogar ténis, como fazíamos no Clube de Campo, através do Twitter?E quem consegue estar a beber uma cerveja com um grupo de amigos através do Instagram? Ou mudar o furo do pneu do carro com a namorada,pelo Whatsapp? Ou comer um churrasco através do Tik Tok? Esta é a verdade das redes sociais, servem apenas para encontrarmos e mantermos contactos com os amigos Ubianos e outros, á distância. E para compreendermos o conceito de “ronda” tão popular entre os guardas nocturnos! Senão vejamos, antes do FB, não conseguiria estar ás 8 da noite no Canadá a falar com o Nuno Ramos á uma e meia da manhã do dia seguinte, na Covilhã! Era impensável, antes de existir o FB sairmos á 1:30h da manhã de casa para irmos bater á porta do Nuno Ramos ou de outro qualquer colega se nos apetecesse falar com ele. Ou com o Gondri a levantar-se ás 8 da manhã para ir trabalhar em Famalicão enquanto me preparo para ir dormir ás 4:00 da manhã em Ottawa. Por muito que quisesse falar com ele não sairia a essa hora de casa! O FB e redes sociais tem isso de fantástico, entre outras virtudes. A ferramenta tem utilidade quando temos objectivos e nos permite a essa hora fazer uma ronda pelos amigos do FB e ver quantos estão activos ou acordados e conseguimos chatear áquela hora! Não há preço que pague isso!Eh!eh! A outra coisa boa é que te podem sempre mandar dar uma curva ou simplesmente desligar. Por isso as amizades se vão mantendo especialmente se a ferramenta for utilizada respeitosamente e sem pôr em causa as liberdades individuais de cada um ou a maneira como está vestido para ir trabalhar enquanto responde á mensagem no Messenger ou ao comentário jocoso e sem maldade no FB.Antes nos 80, quando nos chateávamos com alguém não havia botão para desligar! É ou não é fantástica esta tecnologia?? Por isso ainda que não fizesse falta nos 80 para nos podermos combinar um encontro no Uno e nos divertirmos com os amigos ou para estar com as namoradas,em amena cavaqueira, o FB hoje permite aproximar-nos de alguém que está a 7700km de distância, apenas á distância de um click.Há regras no entanto que devem continuar a ser observadas, pois é um lugar público onde devemos ter cuidado ao escrever um post e não devemos mandar um amigo para aquele sítio, correndo o risco de levar um estaladão se com ele estivéssemos nesse momento fisicamente.Algumas pessoas parecem esquecer isso apenas e só porque estão a comunicar á distância! Daí á chatice e ao voltar das costas informático (por não podermos dar a tal estalada!), é um passo muito pequeno!Assim a primeira regra é o respeito pelos outros, de modo a manter a conversa num nível saudável e incapaz de ferir sensibilidades,o qual deve ser o mesmo de antigamente quando nos encontrávamos fisicamente para beber um copo num lugar público!A segunda que muita gente também parece esquecer, é aquela que diz que devemos primar pela qualidade e não pela quantidade, na forma como interagimos através das redes sociais.Ou seja, não nos devemos dispersar por várias redes sociais, se verdadeiramente não temos tempo para nos dedicarmos razoavelmente a nenhuma delas! Eu só estou numa e já é difícil arranjar tempo suficiente para me concentrar nessa e nas pessoas que dela fazem parte. Felizmente todos os amigos estão lá também!Mas ao contrário do que se passava nos “Eighties” em que íamos ás festas todas, hoje fazer parte de várias redes sociais e plataformas, faz-nos dispersar e não ter tempo para nos dedicarmos verdadeiramente e focarmo-nos numa delas o tempo suficiente para uma presença assídua e manter o contacto, seja constante ou mais esporádico. A menos que estar nas redes sociais seja uma prioridade ou um modo de vida profissional, o que acontecerá com muito poucos de nós. Por isso mais vale uma rede social bem frequentada do que duas ou três “a voar”, por onde passamos apenas muito,mas muito raramente!

Por isso as plataformas digitais dos Encontros Ubianos devem ser participadas e crescer para acrescentar essas amizades e nomes dos antigos alunos á volta do espírito Ubiano de então e transportá-lo para a actualidade através da partilha de histórias e experiências ou tão somente estabelecer algumas conversas e “conversetas” entre quem já há muito tempo não se via ou revia!É uma coisa do género: “Diz-me por onde é que andas, porra, e o que andas a fazer!!”Ou “Gosto de ti,porra! O que é que fazes da vida!??”Ou apenas postar algum acontecimento e sentimentos em torno do que era o espírito Ubiano de então e partilhá-lo com a actual geração de estudantes Ubianos. Os tais que por pertencerem á geração “millenial” perderam todo o gozo, emoção,grande partilha e cumplicidades da academia dos 80.

Por isso, a comemoração desta data deve ser grande e enaltecida pelo esforço de alguns para que a ideia tivesse sido lançada, ganhasse corpo e maturidade e crescesse,fazendo destas plataformas um local de reunião, convívio e local de chamada para o ponto de encontro das actividades que se têm vindo e irão continuar a desenvolver! Ao mentor e fundador destas plataformas há que dar todo o mérito pelo empenho em dar voz á UBI, através dos contributos de todos e de cada um de nós, professores, pessoal auxiliar, alunos que estou certo encontrarão sempre no Facebook ou no Blogue dos Encontros Ubianos um motivo para sorrirem de boa disposição e partilharem o verdadeiro espírito Ubiano que a todos que por lá passámos orgulhosamente nos enche de vaidade e profunda auto-estima.

Quando se tenta encontrar colegas aos quais por diversas razões se perdeu o rasto, ainda que alguns por vezes não queiram ser encontrados ou já não se sintam com ligações fortes á Covilhã, torna-se necessário trazer novamente esses para o convívio, voltando a despertar o espírito Ubiano. Não importa qual a rede social ou plataforma social com que se sintam mais identificados!Tal como o ditado diz “bom filho a casa torna!” esse deve ser o espírito e a motivação de quem um dia connosco dividiu os bancos da Universidade da Beira Interior.

Acabo dizendo que em 2008 organizei o primeiro Encontro de Engenheiros Têxteis, na altura com as dificuldades acrescidas de tentar localizar e convidar ex- alunos e colegas de curso, para um convívio na Natureza, recorrendo a chamadas telefónicas directas cujos contactos foram sendo complementados pelos colegas que conheciam o paradeiro do colega e esse conhecia o paradeiro do outro colega, ou o seu número de telefone, e assim sucessivamente se construir uma pequena base de dados actualizada que actualmente serviu de base também á criação dos Encontros Ubianos. Da Internet, na altura conseguiram-se apenas alguns endereços de correio electrónico! Não havia redes sociais ainda nessa época,o que teria sido fantástico para reduzir os custos e a logística da organização. Sempre pensei como teria sido então diferente e mais fácil contactar,convidar e reunir todos aqueles colegas de curso, professores, etc, que aderiram á iniciativa e se reencontraram depois de quase 15 anos para um salutar convívio. É o que se pretende com as plataformas agora criadas pelo Nuno que todos deveremos alimentar, com a nossa presença e com o nosso contributo enriquecendo o grupo que se pretende o mais alargado e abrangente possível, para permitir o contacto fácil ainda que a 7700kms de distância e ás 4:00 da manhã!Eh!eh!Ou sempre que nos apeteça!.... E continuarmos a acompanhar o quotidiano institucional da nossa UBI….E responder aos convites para as iniciativas que se venham a organizar no futuro, e onde vamos poder tocar-nos, rir, dançar, beber, almoçar, beber, voltar a beber, voltar a dançar, ……e revermo-nos á volta do revisitar das histórias da Academia…. (sem ser através de plataformas digitais!!!!). É esse o famoso,enaltecido e acarinhado “Espírito Ubiano” que é necessário,com o contributo de todos, preservar! Preservar também para memória futura e transmissão posterior ás actuais e nova gerações de “Ubiversitários”! Para isso sim é para o que servem as redes sociais e a página que agora comemora o seu aniversário.Que a este se sigam outros mais ano após ano.

Da minha parte fica o agradecimento pela iniciativa e espero que no próximo ano haja mais envolvidos para sermos mais activos e participativos nas actividades que certamente se seguirão.

Abraço Ubiano

João Leonardo


terça-feira, 25 de agosto de 2020

Revelação bombástica: Osama bin Laden esteve escondido na UBI!



Oiço dizer tanta asneira na Net, tanta teoria da conspiração, que o polígrafo não tem descanso. São tretas e mais tretas: que os americanos é que atiraram as torres gémeas abaixo, que o Bill Gates é que financia a pandemia do covid, que os Estados Unidos é que criaram o vírus para entrar numa guerra económica com a China, enfim, se as fosse dizer a todas dava muitos eucaliptos de papel. E agora até dizem que Osama bin Laden esteve escondido na UBI, que foi o segredo mais bem guardado da republica portuguesa, que o presidente da republica sabia, que o primeiro ministro sabia, eles e mais meia dúzia de altos dignatários do regime sabiam, que havia uma elite muito bem informada a esse respeito que sabia. No entanto, ninguém punha a boca no trombone, o dinheiro sujo do petróleo calava-os a todos. A Osama bin Laden só se pedia discrição e que não desse muito à lábia, não fosse descuidar-se e armadilhar-se a si próprio. O resto os poderosos tratavam.
Osama bin Laden era formado em engenharia civil e entrou na UBI como professor. Sem barbas e sem turbante, e sempre de óculos escuros como o Pedro Abrunhosa, estava a salvo de ser caçado pela fisionomia. Também nunca disse uma palavra de árabe, falava e lecionava exclusivamente em inglês. Entrou no país como “Ivan Peterson”, tudo tratado por um falsário internacional que tinha mais de trinta anos de experiência e um curriculum de trafulhice que faria inveja ao próprio Alves dos Reis. Tratou-lhe dos documentos de identificação e dos documentos que o atestavam como professor, legalizou-o dos pés à cabeça.
Tirando alguns iluminados que agora dizem que já sabiam, nunca ninguém da UBI desconfiou, não havia o mais pequeno indício de que o carrasco das torres gémeas fosse aquele professor estrangeiro, de tez morena, solitário e introvertido, que dava cadeiras ao pessoal de Civil. Na reitoria também nunca faiscou a mínima dúvida, e Osama bin Laden estava como queria enquanto os americanos andavam loucos à sua procura nos mais remotos recantos do Afeganistão e do Paquistão, ou quiçá de algum outro país islâmico. Sentia-se completamente blindado pelo dinheiro do petróleo. Andava descansado da vida porque, pensava, a probabilidade de ser apanhado era mais ou menos igual à probabilidade de ser traçado ao meio por um meteorito no meio rua, ou de ser alvejado nos tomates pelo voo picado de um ganso-patola. A somar a toda a camuflagem logística que o escondia do mundo, havia ainda o facto de Portugal ser um país que, além de insuspeito de esconder terroristas, era também um antro de centralismo onde praticamente só havia Lisboa. Osama bin Laden passou cinco anos na UBI, entre 2005 e 2010, e o erro da sua vida foi ter saído para o Paquistão. O erro da sua vida não, o erro da sua morte - em 2011 os americanos interromperam-lhe definitivamente a contagem dos dias e deixaram a Al-Qaeda a soro.
Há muitos ubianos que, infelizmente, estão a receber chorudos cachés para contar estranhas experiências que se passaram com eles, e que, dizem, só agora conseguem interpretar com olhos de ver. Um desses mentecaptos ubianos, que não tem outro nome, é o Jójó, um engenheiro eletromecânico falhado que encontrou na mentira transatlântica um modo de vida. Já atravessou o Atlântico muitas vezes, em modo skype, para contar o que viu a troco de uns farfalhudos maços de dólares, e o aumento vertiginoso da sua conta bancária é a melhor prova de que não lhe faltou imaginação. Disse que Osama bin Laden (Ivan Peterson, como era fraudulentamente conhecido) passava a vida a ver vídeos do atentado às torres gémeas. Na altura achou estranho, até porque o professor Ivan Peterson, quando os via, não conseguia esconder uma óbvia felicidade psicopática estampada no sorriso. No entanto, nunca lhe passou pela cabeça pensar que era o Osama bin Laden, alguma vez?! Um pensamento desses, tão contrário à lucidez, dava direito a pulseira vermelha nas urgências de psiquiatria. No Afeganistão ou no Paquistão - onde acabou por ser morto -, ou num qualquer outro país de radicais muçulmanos, está bem, agora em Portugal?! Jójó continuou, disse que ouviu o professor Ivan Peterson a falar árabe com um muçulmano de turbante, num banco de jardim. Ele nunca falava árabe em público nem em privado, era muito estranho. Mas o que o deixou mais apreensivo, disse Jójó, é que conseguiu apanhar, no meio daquele falató indecifrável, as palavras “Al Qaeda”. Lembrava-se muito bem. Tinha-se escondido atrás de uma sebe de arbustos verdes, que estava mesmo junto ao banco, e tinha escutado a conversa dos dois homens, secretamente, sem que eles se tivessem apercebido de que não estavam sozinhos. O momento mais intenso foi quando lhe pareceu ouvir, naquela salganhada de sons do árabe, “Osama bin Laden”. Aí ficou em sentido, em alerta vermelho. Não tardou que o muçulmano voltasse a chamar Osama bin Laden ao prof Ivan Peterson. Jójó contou que ficou em pânico. À terceira Jójó contou que tremia. Depois o muçulmano entregou um documento ao professor, levantaram-se e foram embora.
Jójó contou que desde que descobriu que aquele banco de jardim era o sítio das reuniões, cada dia com um muçulmano diferente, começou a dedicar-se muito seriamente à espionagem. A troca de documentos também o intrigou. Um dia levou um binóculo para poder ver, por algum interstício mais aberto da sebe, os documentos ao perto. O muçulmano – que eram sempre muçulmanos – entregou um documento ao professor Ivan Peterson. Jójó apontou o binóculo para o cabeçalho onde estava escrito o nome da pessoa a quem era dirigido, e contou que ia desmaiando quando viu confirmado aquilo que já suspeitava: o documento tinha no cabeçalho, com todas as letras, “Osama bin Laden”.
Depois destas extraordinárias revelações, Jójó teve de aguentar com os jornalistas que pareciam sanguessugas à volta dele. E a pergunta recorrente foi porque é que ele não avisou imediatamente as autoridades. A isso Jójó respondeu simplesmente que teve medo. Teve medo de represálias. Se os fanáticos de Alá o caçassem não teriam problema nenhum em lhe picarem a carne e o comerem de hambúrguer. Naquela altura fora o medo que lhe travara a fala. Mas agora, que já tudo era passado, tinha chegado a hora de dar a notícia ao mundo.
Mas não foi só o Jójó que fez umas massas valentes à conta do Osama bin Laden. Como ele foram mais cinco ou seis que aproveitaram a condição de mentirosos compulsivos, à prova de polígrafo, para enriquecer. E a cada dia que passa mais aparecem, nem que seja para dar as últimas mamadas na teta da abundância.
A notícia de que Osama bin Laden esteve escondido na UBI continua assim a espalhar-se à velocidade da Net, e, com o número de visualizações a crescer exponencialmente, já entrou no top five das teorias da conspiração.

Gondri


domingo, 23 de agosto de 2020

Esta é a Cindy, a aluna mais bela e sensual da UBI...



A Cindy é a aluna mais bela e sensual da UBI. A princípio, além de ser a mais bela, era também a mais chata. A sua chatice residia basicamente no facto de estar sempre a contar que, quando era pequenina, se tinha picado num cato e tinha ficado com “o cu a arder”, na expressão dela. Era impressionante a quantidade de vezes que ela vinha com essa ladainha, especialmente quando se juntava alguém novo ao grupo que não conhecia essa estória “tão picante”. Aliás era sempre assim que introduzia o tema, “vou contar uma picante”, e, quando toda a gente ficava à espera de uma cena porno, saía-se sempre com a do cato.
Não tardou a apanhar a alcunha de Cindy Cato, e há muito quem pense que esse é mesmo o nome dela. Por incrível coincidência, a Cindy é filha de um alto dirigente da CGTP, e, por isso, são também muitos os que pensam que ela se chama Sindicato, por afinidade, nome que agrada muito mais à esquerda do que à direita.
Cindy Cato é uma mulher vistosa e tem metade da população masculina da UBI de olhos vidrados nela, os chamados sindicalistas. No dicionário da UBI um sindicalista é alguém que anda perdido de amores pela Cindy Cato (ou Sindicato, conforme os gostos). E não são só alunos, também há professores a bater mal por causa dela.
O eng. Alcides, assistente de Resistência de Materiais, e um homem muito bem apessoado, entrou na corrida ao coração dela e ganhou, com o seu indiscutível charme. Mas cedo percebeu que a inveja dos derrotados lhe iria fazer a vida negra. Um dia, quando disse que chumbou o Zé Coelho, alguns sindicalistas, feridos de inveja, fizeram-se passar por ativistas dos animais e gritaram-lhe, a espumar de ira, “tu é que devias levar chumbo nessa cabeça, não era o coelho, seu grandessíssimo filho da ….!”. O eng. Alcides bem que tentou explicar que estava a ser mal interpretado, que o chumbo de que falava não tinha nada a ver com munições de caça, mas a gritaria e a indignação dos sindicalistas de coração despedaçado era tanta que tudo o que ele dissesse caía em saco roto.
Os invejosos não davam tréguas, se não era por causa dos alhos era por causa dos bugalhos, a implicação era permanente. E chegou a um ponto que o eng. Alcides não aguentou mais a pressão das invejas que se abatiam sobre si, e, numa decisão muito sofrida, acabou com o namoro.
Ao perceberem o prometedor desfecho, os sindicalistas voltaram a atacar. E o sortudo foi o Tó Zé, seu colega de turma, o galanteador mais cómico da UBI. Conquistou-a a rir, literalmente.
Mas o estado de graça durou pouco. Não tardou a provar, como o seu antecessor, o travo amargo da inveja dos outros. Quando disse que tinha estudado uma semana a fio para Termodinâmica e que mesmo assim tinha apanhado uma raposa, a fúria dos sindicalistas, que dessa vez eram mesmo ativistas dos animais, veio novamente ao de cima. O sindicalista Vitor, destacado militante do PAN e um dos mais intrépidos defensores dos animais da UBI, chegou mesmo a ir às ventas do Tó Zé e, não fora a pronta intervenção de alguns ativistas mais racionais, tinha-o partido todo. Mas o Vitor não ficou sem resposta: o Tó da Fonte, um ativista pró-caça que era uma besta de quase dois metros e três dígitos na balança, espetou-lhe tal lambada que o fez rodar noventa graus no plano cartesiano e estatelar-se na horizontal, completamente desamparado. E ainda não satisfeito, pegou numa pele de raposa que tinha trazido de casa, só para provocar os ativistas dos animais, e atirou-lha para cima enquanto dizia, com enfática ironia: “a que o Tó Zé apanhou era muito mais feia do que esta, fizeste bem que o sovaste...”. De agressão em agressão, de vingança em vingança, não tardou que se instalasse tal arraial de pancadaria que ninguém se surpreendeu quando a CMTV apareceu para dar tudo em direto. Era uma excelente oportunidade para um pico de audiências, as pessoas queriam era sangue. Mas não correu bem: assustados com a ideia de aparecerem na televisão com o rótulo de delinquentes, foram todos cada um para seu lado e a calmaria voltou. E a CMTV ficou a chuchar no dedo.
Tal como o eng Alcides, o Tó Zé também fraquejou na relação e acabou por cair pelo mesmo motivo: não suportou o peso esmagador das invejas.
Mais uma vez o exército de sindicalistas voltou a mobilizar-se. Mas, desta feita, farta de homens fracos e sem resiliência, a Cindy Cato resolveu escolher um homem que resistisse sem vacilar a todas as adversidades. Tinha visualizado na Net alguns vídeos de competições de bofetadas, e, segundo disse, até a ela lhe doera. Era aquela capacidade de sofrimento que queria num homem. Por isso decidiu escolher assim o seu amor, com um casting muito original: um torneio de bofetadas. Tinha pressa, dois dias no máximo para as inscrições, e era para começar logo ao terceiro dia.
O Tó da Fonte, que já tinha começado a treinar com a lambada que dera ao Vitor, que era um touro e que não tinha rival na UBI nessa condição, foi logo o primeiro a inscrever-se para o torneio. Só isso chegou para demover a concorrência toda, cagada de medo. O único que não se esquivou foi o Tico, que, apesar de ser um caga-tacos, com pouco mais de sessenta quilos de pele e osso, era rijo que nem ferro. Rijo e apaixonado, que a paixão também o enchia de coragem. A lista de sindicalistas encantados com a musa era grande, mas, ao fim e ao cabo, só dois é que se aventuraram a lutar por ela. Aliás, só um, que para o Tó da Fonte aquilo não era aventura nenhuma, com o lingrinhas do Tico nem dava para aquecer.
Ao terceiro dia começou finalmente o torneio de bofetadas, num átrio da UBI. Ali não havia dezasseis-avos de final, nem oitavos, nem quatros, nem meias, nem final. Era um torneio simples, só dois competidores. Uma mesinha estreita a separá-los, e era até que um deles desistisse ou perdesse os sentidos. O regulamento era simples: bofetada um, bofetada outro, com um minuto de intervalo entre bofetadas para recuperar.
O átrio da UBI encheu-se de ubianos que só iam mesmo por uma boa gargalhada. Estava à vista de toda a gente que o vencedor seria o Tó da Fonte, ali nem um hipotético milagre se considerava. Até houve quem sugerisse ao grandalhão que tivesse piedade do rapazito. O Tico começou por dar a primeira bofetada ao Tó da Fonte, que, pela sua cara, mal a sentiu, e levou de resposta cá uma bomba que até viu as estrelas todas da Via Látea, sem telescópio nem nada. A assistência desmanchou-se a rir, e foi um pagode. Ainda tonto e a cambalear, o Tico não recuou e deu a segunda, mais fraquinha ainda do que a primeira, e voltou a levar de volta outro morteiro que o deixou outra vez a ouvir passarinhos. Tiveram que o amparar senão ele caía. Aconselharam-no a parar por ali porque podia ser grave, mas ele insistiu, e à terceira voltou a levar outra dose de cavalo e ficou ainda mais sem conserto do que já estava. Mais morto que vivo, perigosamente ferido, já sem visão e tão tonto que mal se segurava em pé, ainda assim insistiu, contra todos os conselhos, e apresentou-se para a quarta. Deu a sua bofetada, já tão brandinha que para o Tó da Fonte não passou de uma festinha, e, na resposta, o inevitável aconteceu: perdeu os sentidos e pôs finalmente fim ao massacre.
Mas o melhor estava para vir: quando toda a gente esperava que a Cindy Cato se lançasse num beijo molhado para cima do Tó da Fonte, ela ficou junto ao Tico, esperou pacientemente que ele acordasse, e, quando ele finalmente abriu os olhos, abraçou-o e disse-lhe, com os lábios colados ao ouvido: - és tu, Tico, que eu quero, és dos que nunca desistem.

Gondri





domingo, 16 de agosto de 2020

Em tempo de candidaturas ao ensino superior, desafortunadamente a UBI não conta com a divulgação dos "mass media". E a culpa é do burro da Greta.

Associação de moradores oferece um burro a Greta Thunberg para se ...
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A UBI anda zangada com os meios de comunicação social por falta de cobertura e, principalmente, por uma desconsideração em concreto que indignou a instituição. Quando Greta Thunberg chegou a Lisboa vinda dos Estados Unidos, a bordo de um veleiro, usando apenas a energia limpa do vento, em Dezembro de 2019, estava previsto que fizesse uma breve estadia em Lisboa e que depois seguisse para Madrid. Na capital espanhola seria uma das oradoras mais esperadas da COP25, a cimeira do clima, onde quase duzentos países e milhares de líderes mundiais iriam debater medidas para proteção do ambiente. Na altura especulou-se muito sobre que meio de transporte ela utilizaria de Lisboa a Madrid. Esperava-se que fosse, obviamente, consequente com aquilo que defendia, e que rejeitasse o uso de combustíveis fosseis na absoluta totalidade do percurso, sem um centímetro sequer de exceção. O comboio elétrico seria a solução óbvia de energia limpa, o pior é que não chegava a todo o lado, era sempre preciso cumprir pedaços de estrada de carro ou autocarro, antes e depois do comboio, e, além disso, havia um troço de cem quilómetros no percurso Lisboa-Madrid que ainda só estava disponível com locomotiva a gasóleo. Não estava nada fácil, não senhor. Houve quem sugerisse a bicicleta, mas, azar do caneco, a Greta sofre de ciclofobia (medo de andar de bicicleta), e nem pode ouvir falar em veículos de duas rodas. Ou seja, tinha que se encontrar urgentemente uma solução. A UBI foi a primeira a chegar-se à frente: anunciou que colocava um burro à disposição da Greta para a viagem. (Constou-me que o burro era descendente de um outro burro que, na latada do meu ano de caloiro, percorreu as ruas da Covilhã com um barril de vinho carrascão no dorso, deixando dezenas de ubianos estendidos nos corredores do hospital com uma valente cabra e alguns comentários depreciativos, tipo “se não sabe beber beba mer**”, a minar-lhes a reputação). “UM BURRO PARA GRETA” era o slogan com que a UBI esperava poder intervir com grande visibilidade, mas os meios de comunicação social ignoraram por completo a iniciativa, não deram uma única notícia sobre o assunto, e ficou mais uma vez claro que a beira interior continua a ser um lugar esquecido nos mapas que se fazem em Lisboa. Como se isso não bastasse, começaram a surgir noticias como, cito, “a associação de moradores de Fray Hernando de Talavera de la Reina (Toledo) pôs um burro à disposição da jovem ativista sueca Greta Thunberg para esta se deslocar de Lisboa até Madrid, onde irá participar na COP25, a cimeira do clima”, e outras a noticiar mais casos de pessoas e entidades que também disponibilizavam burros. Só a oferta pioneira da UBI é que foi incompreensivelmente ignorada. A indignação dos ubianos foi um ato reflexo inevitável, todos os meios de comunicação social passaram imediatamente à condição de “persona non grata” e, até agora, ainda não fizeram nada para se reabilitarem aos olhos da UBI.
A reboque deste episódio, abriu-se uma grande discussão sobre o assunto na universidade da Beira Interior. O eng. Rodrigues, um ubiano licenciado em matemática que andava a tirar doutoramento sobre a propriedade comutativa e que estava de tal modo absorvido pelo tema que passava a vida a imaginar como seriam as coisas se estivesse tudo ao contrário, perguntou logo: se em vez de se dar um burro à greta, porque é que não se dá antes uma greta ao burro. Ora, quando ele veio com essa de dar uma greta ao burro, os transexuais e defensores da transexualidade em geral ficaram radiantes com a ideia. Claro que se o burro fosse muito macho recusaria terminantemente a oferta da greta. Mas, se pelo contrário não se identificasse com o sexo com que nasceu e, no íntimo, se sentisse uma burra, então era óbvio que aceitaria a greta, emotiva e agradecidamente.
Sem dar por isso, o eng Rodrigues tinha reacendido a discussão da ideologia de género que naquela altura até estava muito apagada. O que valeu para que os desencontros de opinião não se agudizassem e não voltassem a desestabilizar a paz social que se vivia na UBI, foi que o Gonçalves, um ubiano vegan, destacado membro do PAN, veio logo desviar as atenções para a causa animal, muito preocupado com o burro. Na sua página do facebook disse, em tom irónico, que até apoiava a ideia do burro, desde que fosse a greta a acartar com ele às costas até Madrid. “Levar um burro às costas de Lisboa a Madrid sem recurso aos combustíveis fósseis seria uma iniciativa exemplar, tanto no plano do combate às alterações climáticas, como no âmbito da cruzada pelo bem estar animal”, afirmou. Claro que a ideia estapafúrdia de ser a Greta a montar o burro era completamente inaceitável, acrescentou, “os animais não são coisas e têm direitos, não podem ser usados, e muitos menos ser alvo de maus tratos”.
Os comentários e as sugestões sucediam-se a um ritmo alucinante,  e cedo surgiram comentadores que defendiam que o fracasso da oferta do burro à Greta se devia ao facto de ter sido uma ideia sem originalidade. Teria sido muito mais interessante oferecer um dromedário, disse o ubiano António, aluno de História e Teoria da Música, que era um apaixonado pela bossa nova de João Gilberto. Não tardou a que alguém perguntasse porque é que em vez de um dromedário não era mas é logo um camelo, assim a Greta iria amparada por duas bossas, e seria muito mais confortável. O António não disse que não, achava bem que fosse um camelo. Mas não um camelo qualquer, tinha que ser um camelo originado a partir de um dromedário, acrescentando-lhe uma bossa nova. A bossa nova de João Gilberto, obviamente. “Ofereçam um camelo à Greta, mas um camelo que, antes do milagre da música, tenha sido um dromedário”, disse nas redes sociais.
Claro que a malta de engenharia genética veio logo dizer que a única maneira de alterar o dromedário era geneticamente, que a ideia de o alterar musicalmente era um perfeito disparate. Por isso rejeitou liminarmente a ideia do camelo feito a partir do dromedário com recurso à música, e defendeu a tese do camelo original. Quando muito podia aceitar que um dromedário fizesse de camelo aplicando-lhe uma nova bossa protésica. Não via no entanto qualquer necessidade de recorrer a dromedários e a dispendiosas próteses, quando, afinal, o que não faltavam era camelos por aí, a começar pelos da Assembleia da República.
O debate de ideias acerca da viagem da Greta, de Lisboa a Madrid, estava cada vez mais vivo, não se falava noutra coisa, era um autêntico monopólio temático que atingia todas as conversas. Como não podia deixar de ser, os ambientalistas e os ativistas animal começaram a destacar-se e, tirando uma ou outra fação de excêntricos paranóicos, como o ubiano António dos dromedários alterados musicalmente, tornaram-se as duas correntes de pensamento dominantes. No início ainda tinham algumas divergências que os afastavam, mas, com o tempo e com o diálogo, foram alisando arestas até que se fundiram numa frente única (a AAA, Associação Ambiente Animal) e reduziram todas as outras correntes de opinião a um nicho insignificante. A mensagem para a Greta era clara: nem combustíveis fósseis nem a utilização de animais, as duas condições em simultâneo. O percurso de ferrovia eletrificado era pacífico, aí tudo bem, o pior seria quando chegasse o tal troço de cem quilómetros ainda por eletrificar. Sem gasóleo na locomotiva e sem alternativa animal, a vida não estava fácil para a Greta. A AAA, Associação Ambiente Animal, desejou-lhe sorte e ofereceu-lhe a propósito um par de ténis top, com características especiais de conforto e amortecimento, e, principalmente, com um sistema “anti-bolha” especialmente adaptado a grandes caminhadas.

Gondri

domingo, 9 de agosto de 2020

Calem-se que vem lá o Fiadeiro!!!



Disseram-me aqui há uns tempos que um professor de Literatura Portuguesa da UBI, todo p'rá frentex, resolveu dar uma aula de literatura a rir, sobre um texto cómico, um comentário jocoso à foto anexa: “um cavalheiro nunca ultrapassa uma senhora, isso é ponto assente. E também não há nada, nem na Bíblia nem na Constituição da República, que diga que um homem não pode regalar as vistinhas com paisagens do foro da anatomia. Por isso a chata rabujenta da mulher dele que meta uma rolha e esteja caladinha. Ou então que arranje uma bicicleta e vá ela p'rá frente do carro, insinuar-se lascivamente com o selim enterrado entre as nalgas...”. 
A intenção do professor era seguir um método pedagógico que ele achava muito mais profícuo, o de ensinar literatura a rir, de integrar o humor como forma de entusiasmar os alunos e facilitar a aprendizagem dos conteúdos. Depois da leitura do texto seguir-se-ia a análise interpretativa e todas as abordagens típicas do estudo literário àquele nível, e, tirando o facto de se tratar de um texto muito pouco ortodoxo, tudo o resto estava dentro das normas. 
O problema foi que a aula disparou numa risada coletiva e a avalanche sonora espalhou-se como por osmose e atingiu outras salas de aula, e a consequente indignação de outros professores, que consideraram aquilo uma interrupção inadmissível e uma falta de respeito. Como se isso não bastasse, ao cagaçal entrópico das gargalhadas somaram-se algumas tiradas dos alunos mais alterados, que, deitando p’ra trás das costas o decoro e o dever de silêncio, se saíram com expressões menos dignas. Houve um que furou a barafunda geral exclamando em alta voz “esta é que tem uma peidola do caralhote!”. Outro, que tinha a mania que era poeta, apercebendo-se de que o termo “caralhote” podia ser confundido com uma das asneiras mais reles e ordinárias do calão lusitano, prontificou-se a vir em auxílio do colega, e, inocentando-o por via poética, declamou:

“caralhote” não é asneira 
a sílaba “te” no final 
desinfeta-o de tal maneira 
que lhe restitui a moral…

E para a “peidola”? – comentou outro em grande alarido – não tens nenhuma estrofe? De facto “peidola” não era uma daquelas asneiras pesadas, era, quanto muito, uma palavra feia. E, acusando o desafio, o poeta regressou à lide:

Há quem diga que viola
o decoro, que é foleira,
mas na verdade “peidola”
nem sequer é uma asneira.

E assim se foram sucedendo as bocas e as piadas. Às duas por três houve quem sugerisse que se reproduzisse ali o espírito do “Clube dos Poetas Mortos”, e começaram todos a subir para cima das mesas, e num canto da sala recitava-se a lírica de Camões, noutro a Mensagem de Pessoa, e a poesia brotava como as fumarolas fervilhantes dos Açores, “carpe diem, carpe diem”, gritava-se, a euforia tomava proporções quase alucinogénicas.
O professor perdeu completamente o controlo da situação e o barulho ensurdecedor acabou por ter consequências. Os professores que estavam a dar aula nas salas adjacentes não se contiveram mais e irromperam de rompante na festa, “o que é que se passa aqui, está tudo doido?”, vociferavam com cara de poucos amigos, eles próprios incrédulos com o que viam. Apesar de tudo a coisa até foi mais ou menos pacífica, o pior foi quando chegou o professor Fiadeiro que não tolerava sequer que uma mosca zumbisse à porta da sua sala. 
Eu sempre achei o Fiadeiro um excelente professor, explicava com limpidez, cada palavra no seu lugar, sem portantos nem efetivamentes, tudo muito claro, uma voz grave, cheia e colocada, um porte físico de meter respeito e uma presença de líder. Parecia um conferencista de elite, tinha classe. Mas ao mesmo tempo era assustador, para pôr os alunos todos a tremer era um instantinho, e então quando chamava alguém ao quadro é que era um filme de terror. Quando se irritava atirava os decibéis todos lá para cima e a voz dele perturbava tudo ao seu redor, inclusivamente as aulas de outros professores, mas ai de quem perturbasse as suas, por pouco que fosse. Quando olho para trás e recordo aquela sua pose dura e ditatorial tenho a convicção de que ele não era nada daquilo, que no fundo era um coração mole. Encarnava aquele boneco austero e severo para manter um certo distanciamento, e com isso a integridade e a coerência, e sobretudo a justiça na hora de avaliar. Esse era o verdadeiro Fiadeiro, sem máscara, mas compreendo perfeitamente aqueles que, não o conhecendo e tendo o azar de o apanhar com os azeites, o achavam uma besta…
Naquele dia o professor Fiadeiro estava a dar Tinturaria numa sala relativamente distante e já pouco sofria o incómodo do barulho da aula de literatura portuguesa, mas o que lá chegava era suficiente para lhe fazer saltar os nervos. Lançado como um míssil em direção ao foco, aí foi ele com o seu metro e noventa, ou coisa parecida, os seus cem quilos, a passar, e com um vozeirão e uma cara de mau que poria em sentido um pelotão de tropas especiais. Quando chegou, aos gritos, a fumegar, com aquele estilo imponente e atemorizador, desceram todos das mesas, meteram o rabo entre as pernas, alguns nem conseguiram segurar os intestinos e empestaram a sala de fedores pouco recomendáveis, outros tremiam como se tivessem visto o Frankenstein, mas não houve um único que se atrevesse a abrir a boca que não fosse para respirar. O professor Fiadeiro demorou a acalmar e desancou no professor de literatura à frente de todos, e o coitado, caladinho que nem um rato, nada podia dizer, porque, perante o festim carnavalesco que ali se assistira, não havia mesmo nada que pudesse dizer em sua salvação. 
Felizmente a coisa passou e não teve repercussões, nem para o professor, nem para os alunos. A reitoria soube do caso mas decidiu não reagir, em nome da paz, até porque a promessa de que não voltaria a acontecer foi acolhida com confiança. O professor não abdicou dos seus processos e continuou a ensinar pelo riso, não sem antes obter da parte dos alunos, sob palavra de honra, a garantia de que não voltariam a passar-se da cabeça. E o que fica para a história é que aquele professor de literatura portuguesa, bem-humorado e sonhador, ao bom estilo do professor John Keating (Robin Williams) do clube dos poetas mortos, nunca foi igualado na proficiência com que preparou os seus alunos. Além de estar por trás das melhores notas das pautas, forneceu à sociedade uma invejável fornada de ubianos com substrato.

Gondri

    segunda-feira, 3 de agosto de 2020

    No refeitório da residência de Santo António - o "sim" deixava tudo em aberto...

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    Naqueles meus tempos de ubiano eu era uma espécie de consultor gastronómico, não dos cozinheiros do refeitório da residência, mas sim dos meus colegas mais próximos que chegavam para comer e queriam saber se valia a pena meterem-se na fila, ou se era melhor darem logo à sola. Era uma espécie de inspetor da ASAE, não tanto vocacionado para a qualidade microbiológica dos alimentos, mas mais para verificar se a comida era tragável ou intragável. 
    Mas era preciso ter cuidado com as minhas opiniões porque comigo marchava tudo, raramente ficava desconsolado. Se bem me lembro, tirando um ou outro caso em que a coisa corria mal aos cozinheiros, a única comida que eu detestava eram os filetes. Ou por não serem frescos, ou por não sei o quê, normalmente eram o patinho mais feio que me descia as goelas. Mesmo assim comia, não era lorde.
    Sempre fui de boa boca, esquisitices com a comida não era comigo. Certo dia houve um levantamento de rancho, um protesto generalizado porque a comida (não me recordo o que era) estava uma bosta. E o refeitório teve que improvisar outra comida à última da hora, salvo erro fizeram umas omeletes. Eu comi a que estava mal, e regressei para comer a que estava bem…, e não morri.  
    Mas a minha boa boca não era geral, havia muito enfastiado crónico que não gostava de nada e metia defeitos em tudo. Por isso é que me tornei no barómetro do paladar de muito boa gente que, mal chegava ao refeitório, me procurava para tirar o azimute à refeição:
    - então Gondri, a comida hoje está boa?
    Se eu dissesse que não davam logo meia volta e punham-se a andar dali para fora, nem valia a pena uma segunda opinião (para o Gondri não gostar aquilo tinha que estar mesmo incomestível...). Se eu dissesse que sim duas coisas podiam acontecer: ou estava mesmo boa ou, estando boa para mim, não o estava para mais ninguém. E aí requeria-se sempre uma segunda opinião. Ou seja, vinculativo só o "não". O "sim" deixava tudo em aberto...
    (Ainda hoje me orgulho de ser de boa boca, não estamos em tempo de ser esquisitos...).

    Gondri