O Teodósio era um puto recém chegado à UBI, tímido como o raio, muito ensimesmado e que não era visto propriamente como aquele colega que, mesmo que passasse pelos pingos da chuva, poderia haver aqui ou ali algum nerd que lhe fosse mais chegado. Não era mal formado ou mal educado mas também não era necessariamente um íman social. A rotina diária, sempre solitária, tinha apenas três pontos no seu GPS interno: casa, Universidade e cantina.
Certo dia, um daqueles cuja meteorologia metia medo ao susto, conheceu Minerva, uma moça que vinha em Erasmus proveniente do Instituto Politécnico de Vaduz, onde, apenas por um alinhamento astral improvável, era a versão dele em feminino. Quis o acaso que tivessem de comer juntos nas cantinas de Sto. António uma vez que todos os lugares estavam ocupados. Por pessoas, por mochilas ou amigos invisíveis. E eles eram tímidos demais para pedirem para se sentar junto de outros colegas.
Ficaram portanto ali especados um em frente ao outro e, aos poucos, foram desenvolvendo um dialecto próprio - ela não pescava uma de português e ele via-se da cor da abelha para perceber liechtensteiniano - bastante satisfatório a nível auditivo porém muito vago ao nível cognitivo. E essa interacção apenas se produzia através de onomatopeias consoante o que iam achando da comida. Em certa medida, dois alunos com evidentes problemas relacionais e comportamentais por resolver, interagiam como dois Neandertais em volta de um javali no espeto. Isto provocou uma onda de indignação e espanto perante os demais colegas que ao longo dos tempos iam-se apercebendo que afinal de contas aqueles dois tinham quebrado uma barreira linguística de uma forma que poderia servir de base para uma tese de doutoramento qualquer. Não era de estranhar portanto, que a malta de Sociologia fosse aquela que se sentava ao redor, a fim de ir captando aqui e ali algum motivo para aprofundar.
Não pensem no entanto que era sempre uma conversa cordial. Minerva era vegan e Teodósio era carnívoro. O que provocava grandes altercações entre os dois por falta de acordo e por, cada um e à vez, irem derrimindo os argumentos do outro. A conversa ficava feia quando ela argumentava em modo grunhido insatisfação por ele estar a mastigar um peru ou quando ele queria à força toda que ela experimentasse salpicão. Mas em contraponto era um deleite para os sentidos vê-los quase orgásticos a degustar um bróculo envolvido numa folha de alface. O êxtase era tal que numa vez foram chamados à reitoria para dar explicações. Não por o reitor ser meio tã-tã (todos sabemos que alguns reitores parecem sê-lo mas ninguém se atreve a dizê-lo) mas porque tinham decidido fazer uma table dance em bottomless depois de espalharem paté de grão de bico no alho francês de um auxiliar que ia a passar.
O pouco que se sabe deles é que ela voltou a Erasmar em Nice, Fucking e Bro (França, Áustria e Suécia) enquanto ele voltou para a Coina onde é professor de Álgebra. Encontram-se todos os anos em Kagar na Alemanha para pôr a conversa em dia.
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