Quem é que se lembra de uma conferência sobre o Einstein na UBI, p'ráí há trinta anos ou mais? O conferencista era um brasileiro, salvo erro professor nos Estados Unidos, e que, segundo disse, conhecia muitas das maiores sumidades da física, e alguns prémios nobel. Eu fui assistir, ávido de o ouvir.
O Einstein era um mito no meu imaginário, uma espécie de estrela maior na constelação dos cientistas. Apesar de aquela não ser uma aula normal, de estar fora do curriculum e não contar para nada, nunca assisti a nenhuma outra aula com tanto interesse e arrebatamento. Lembro-me de ter saído de lá mais pequenino do que pequenino, com uma profunda sensação de insignificância face a um universo de dimensões que iam muito para além do entendimento humano. Acho que nunca antes eu tinha encarado com tanta clareza e humildade o meu lugar no universo. Vivi aquele momento com grande intensidade, e nessa noite, como se estivesse num filme, fiquei demoradamente de olhar fixo nas estrelas encandeado por milhões de mistérios…
Se aquela conferência teve um enorme impacto na minha forma de estar e de ver o mundo, deixou-me também algumas recordações pontuais que sempre que posso conto nas minhas breves tertúlias sobre ciência. Lembro-me perfeitamente que o professor abriu a conferência a dizer “só há um cientista com categoria para se sentar ao lado de Newton: Einstein”. Claro que o Galileu apareceu logo na conversa interativa que o professor foi mantendo com a plateia, mas o professor defendeu que, apesar de ser um grande, Galileu estava alguns degraus abaixo, as estrelas maiores eram definitivamente Newton e Einstein. E disse mais, disse que o maior de todos ainda assim era Newton, que a física que utilizamos para compreender o nosso mundo ainda é a dele. Einstein já é uma física à velocidade da luz, já é onde a física toca na filosofia com formulações teóricas como o paradoxo dos gémeos, que já extravasa o nosso dia a dia e se lança a explicar o espaço-tempo, os buracos negros, etc…
O Einstein era um mito no meu imaginário, uma espécie de estrela maior na constelação dos cientistas. Apesar de aquela não ser uma aula normal, de estar fora do curriculum e não contar para nada, nunca assisti a nenhuma outra aula com tanto interesse e arrebatamento. Lembro-me de ter saído de lá mais pequenino do que pequenino, com uma profunda sensação de insignificância face a um universo de dimensões que iam muito para além do entendimento humano. Acho que nunca antes eu tinha encarado com tanta clareza e humildade o meu lugar no universo. Vivi aquele momento com grande intensidade, e nessa noite, como se estivesse num filme, fiquei demoradamente de olhar fixo nas estrelas encandeado por milhões de mistérios…
Se aquela conferência teve um enorme impacto na minha forma de estar e de ver o mundo, deixou-me também algumas recordações pontuais que sempre que posso conto nas minhas breves tertúlias sobre ciência. Lembro-me perfeitamente que o professor abriu a conferência a dizer “só há um cientista com categoria para se sentar ao lado de Newton: Einstein”. Claro que o Galileu apareceu logo na conversa interativa que o professor foi mantendo com a plateia, mas o professor defendeu que, apesar de ser um grande, Galileu estava alguns degraus abaixo, as estrelas maiores eram definitivamente Newton e Einstein. E disse mais, disse que o maior de todos ainda assim era Newton, que a física que utilizamos para compreender o nosso mundo ainda é a dele. Einstein já é uma física à velocidade da luz, já é onde a física toca na filosofia com formulações teóricas como o paradoxo dos gémeos, que já extravasa o nosso dia a dia e se lança a explicar o espaço-tempo, os buracos negros, etc…
Estava o professor nas suas considerações quando de repente se saiu com uma que deixou a plateia toda de boca aberta: “eu não compreendo a lei da gravitação universal de Newton”. Ficámos todos pasmados a olhar para ele. Nós, coitadinhos de nós que não percebíamos nada daquilo à vista dele, percebíamos a lei da gravitação, e ele não percebia?! “Eu vejo e confirmo que ela funciona, mas não consigo compreender como é que é possível que ela funcione”, acrescentou. Estávamos todos incrédulos e confusos, e alguns comentários, geralmente bem humorados, foram surgindo ao longo da sala. O professor alimentou o “suspense” por alguns momentos, e lá se decidiu a clarificar: “é que eu não consigo entender como é que a fórmula funciona sem entrar com o tempo. Mas lá que funciona, funciona…”. Todos sabíamos que Einstein revolucionara a física ao introduzir uma quarta dimensão – o tempo – mas nunca nos passara pela cabeça questionar como é que a lei da gravitação de Newton podia funcionar sem o tempo, isso era demais para os nossos cerebrozinhos cheios de normalidade. Tínhamos aprendido a lei ainda no ensino secundário, e entendíamo-la perfeitamente. Paradoxalmente, só mesmo uma grande cabeça como a daquele ilustre conferencista é que podia não entender uma coisa daquelas…
Isto agora faz-me lembrar um certo professor que, numa certa aula a que assisti (lamentavelmente já não me recordo nem que professor nem que aula), quando se falava da importância da curiosidade e do espírito crítico, disse “eu avalio melhor um aluno pelas perguntas que me faz do que pelas respostas que me dá”. Nunca mais me esqueci desta frase lapidar, é uma espécie de relíquia a que recorro muitas vezes. Ninguém na sala, exceto o conferencista, tinha capacidade para se perguntar como é que a fórmula da lei da gravitação de Newton funcionava, como é que era possível que ela funcionasse? Todos a entendiam, todos a percebiam, nunca a ninguém passara pela cabeça que não era suposto ela funcionar. E muito menos por causa de não entrar com o tempo. Às vezes um tipo tem que ter muita cabeça para que os ignorantes pensem que ele é burro…
Outro momento empolgante foi quando o professor disse que Einstein tinha ganho o nobel da física mas que não tinha sido com a relatividade, porque, disse com eloquência e ironia, “a teoria da relatividade está acima de qualquer prémio humano”. (De facto Einstein recebeu o nobel da física com um trabalho apesar de tudo menor no conjunto da sua obra, pelas suas contribuições para a física teórica, especialmente pela descoberta da lei do efeito fotoelétrico). E se o disse com ironia foi porque já tinha na manga um vasto leque de críticas ao modo injusto como por vezes o nobel era atribuído. Ele falava do que sabia, disse, porque andava lá no meio deles. Lembro-me perfeitamente de, a título de exemplo, ele ter contado a história de uma injustiça. Vou tentar explicar aqui o essencial, de uma forma básica que é como me lembro. Básica, mas elucidativa. Contou então ele que havia um ilustre cientista, salvo erro americano, que andava na peugada das chamadas “radiações de fundo”, que se fossem detetadas constituiriam uma extraordinária descoberta e um apoio decisivo à teoria do big bang. Esse cientista era a maior sumidade mundial no tema, e “encontrar” as radiações de fundo era o propósito da sua vida. Entretanto, lá num sítio qualquer, dois engenheiros foram contratados para montar uma grande antena parabólica, não sei precisar onde, nem como nem porquê. Acontece que a certa altura a antena começou a detetar umas interferências estranhas e indesejáveis que os engenheiros não conseguiam explicar nem eliminar. Pensaram que era uma avaria mas verificaram tudo minuciosamente e não encontraram nada de errado. De seguida aperceberam-se que uns pássaros tinham feito ninho na antena e julgaram que tinham dado com o gato. Mas limparam tudo e, para continuado desânimo, as interferências mantiveram-se. Até que este episódio chegou aos ouvidos do tal cientista líder mundial da caça às radiações de fundo. O homem foi lá, viu a coisa, e foi o “eureka” da vida dele: aquilo eram as radiações de fundo que ele há tanto procurava! Resultado: os engenheiros ganharam o nobel da física pela descoberta das radiações de fundo. O cientista, que foi lá dizer-lhes o que era aquilo porque eles não sabiam, ficou a zero.
O conferencista disse que aquele não era, infelizmente, caso único de injustiça, que os prémios humanos padeciam dos mesmos males da humanidade. Por isso é que o facto de a relatividade nunca ter ganho o nobel até a dignificava mais, libertava-a da fraqueza humana e elevava-a à grandeza de Deus. “A teoria da relatividade está acima de qualquer prémio humano” foi mesmo a frase mais poderosa que já ouvi proferir em elogio à obra maior de Einstein.
E por aqui me fico nas lembranças de uma conferência ubiana muito especial sobre um homem que viveu completamente a leste das frivolidades da vida, do dinheiro e do sucesso. Foi um espírito elevado, inconciliável com a superficialidade e a vida de aparências que comanda a maioria dos seres humanos. Um homem simples que, apesar de se ter tornado uma das pessoas mais famosas do mundo, nunca ligou nada a isso. Tinha demasiadas coisas extraordinárias em que pensar…
Isto agora faz-me lembrar um certo professor que, numa certa aula a que assisti (lamentavelmente já não me recordo nem que professor nem que aula), quando se falava da importância da curiosidade e do espírito crítico, disse “eu avalio melhor um aluno pelas perguntas que me faz do que pelas respostas que me dá”. Nunca mais me esqueci desta frase lapidar, é uma espécie de relíquia a que recorro muitas vezes. Ninguém na sala, exceto o conferencista, tinha capacidade para se perguntar como é que a fórmula da lei da gravitação de Newton funcionava, como é que era possível que ela funcionasse? Todos a entendiam, todos a percebiam, nunca a ninguém passara pela cabeça que não era suposto ela funcionar. E muito menos por causa de não entrar com o tempo. Às vezes um tipo tem que ter muita cabeça para que os ignorantes pensem que ele é burro…
Outro momento empolgante foi quando o professor disse que Einstein tinha ganho o nobel da física mas que não tinha sido com a relatividade, porque, disse com eloquência e ironia, “a teoria da relatividade está acima de qualquer prémio humano”. (De facto Einstein recebeu o nobel da física com um trabalho apesar de tudo menor no conjunto da sua obra, pelas suas contribuições para a física teórica, especialmente pela descoberta da lei do efeito fotoelétrico). E se o disse com ironia foi porque já tinha na manga um vasto leque de críticas ao modo injusto como por vezes o nobel era atribuído. Ele falava do que sabia, disse, porque andava lá no meio deles. Lembro-me perfeitamente de, a título de exemplo, ele ter contado a história de uma injustiça. Vou tentar explicar aqui o essencial, de uma forma básica que é como me lembro. Básica, mas elucidativa. Contou então ele que havia um ilustre cientista, salvo erro americano, que andava na peugada das chamadas “radiações de fundo”, que se fossem detetadas constituiriam uma extraordinária descoberta e um apoio decisivo à teoria do big bang. Esse cientista era a maior sumidade mundial no tema, e “encontrar” as radiações de fundo era o propósito da sua vida. Entretanto, lá num sítio qualquer, dois engenheiros foram contratados para montar uma grande antena parabólica, não sei precisar onde, nem como nem porquê. Acontece que a certa altura a antena começou a detetar umas interferências estranhas e indesejáveis que os engenheiros não conseguiam explicar nem eliminar. Pensaram que era uma avaria mas verificaram tudo minuciosamente e não encontraram nada de errado. De seguida aperceberam-se que uns pássaros tinham feito ninho na antena e julgaram que tinham dado com o gato. Mas limparam tudo e, para continuado desânimo, as interferências mantiveram-se. Até que este episódio chegou aos ouvidos do tal cientista líder mundial da caça às radiações de fundo. O homem foi lá, viu a coisa, e foi o “eureka” da vida dele: aquilo eram as radiações de fundo que ele há tanto procurava! Resultado: os engenheiros ganharam o nobel da física pela descoberta das radiações de fundo. O cientista, que foi lá dizer-lhes o que era aquilo porque eles não sabiam, ficou a zero.
O conferencista disse que aquele não era, infelizmente, caso único de injustiça, que os prémios humanos padeciam dos mesmos males da humanidade. Por isso é que o facto de a relatividade nunca ter ganho o nobel até a dignificava mais, libertava-a da fraqueza humana e elevava-a à grandeza de Deus. “A teoria da relatividade está acima de qualquer prémio humano” foi mesmo a frase mais poderosa que já ouvi proferir em elogio à obra maior de Einstein.
E por aqui me fico nas lembranças de uma conferência ubiana muito especial sobre um homem que viveu completamente a leste das frivolidades da vida, do dinheiro e do sucesso. Foi um espírito elevado, inconciliável com a superficialidade e a vida de aparências que comanda a maioria dos seres humanos. Um homem simples que, apesar de se ter tornado uma das pessoas mais famosas do mundo, nunca ligou nada a isso. Tinha demasiadas coisas extraordinárias em que pensar…
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"Os fins banais do esforço humano: propriedade, êxito exterior e luxo pareceram-me desprezíveis desde jovem".
Albert Einstein, in 'Como Vejo o Mundo'
Gondri
2 comentários:
Simplesmente fabuloso, obrigado Caro Gondri.
O nosso amigo Gondei tem uma memória de louvar, vai buscar não só os eventos, mas adiciona lhe os detalhes dignos não só de um contador de histórias mas de alguém que está muito acima dos comuns dos mortais que se sentaram naquelas cadeiras, degraus de escada e quiçá muitas vezes em cima das mesas da nossa querida escola que fez de nos melhores pessoas e melhores profissionais.
Grande abraço para todos e um especial para o amigo Gondri que nos faz relembrar e quiçá “viver no tempo” os grandes momentos que passamos naquela ilustre instituição de ensino!!!
Boa semana para todos e cuidem-se, Paulo Sousa
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